segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Olhos Azuis

Bom, postei o segundo conto dos "7" então resolvi postar o primeiro... O que germinou toda a ideia.

Músicas:
1º Damien Rice - 9 Crimes
Damien Rice - Grey Room



Os olhos se abrem, abrem lentamente após uma noite tranqüila, tranqüila como sua vida, tranqüila como uma brisa de verão. Seus olhos se abrem contra a claridade que passa pela janela, contra o brilho do sol que veio iluminar mais um dia e reflete o brilho mágico dos olhos de um sonhador, que com seus olhos azuis, azuis como o céu, azuis como o mar, azuis como quiser imaginar, vai olhar a janela pra ver a rua, saudar seu dia, mais um dia, outro dia, um novo dia.
Ao sair do quarto, mais uma vez seu olhar presencia o vazio, a falta de outra pessoa no apartamento, em que com toda a sua organização so é possível presenciar os móveis, os livros, a solidão. Não há um parente, não há nenhuma criança, não há nem uma mulher para se sentir amado, não há nem um animal para chamar de amigo, há apenas ele, sozinho, com seus 25 anos e sozinho. Com os seus 25 anos, sozinho e se perguntando: O que realmente desejo viver?
Durante seu banho, a água desliza sobre seu corpo jovial que o tempo ainda não se preocupou em desfazer, ele sente o vapor na pele, a calma emana de seu corpo e seus olhos se fecham para sentir a água deslizar pelo seu rosto, escorre pela barba por fazer e fluir por entre suas linhas corporais até atingir o chão por onde ela esvai. Vai para seu quarto e pega a primeira roupa que lhe parece interessante e a veste. Arruma-se, calça seus sapatos, pega seus materiais e sai porta a fora, esperando algo que valesse a pena após tantos meses sem sentido, sem sentir o vigor de viver, como há alguns anos atrás.
Dentro de seu carro uma musica toca, mas pra ele num faz sentido algum, os sons perderam o valor, assim como seus belos olhos já não enxergam o que realmente é belo pelo caminho que faz. Ao chegar ao seu destino, entra em sala e senta-se no fundo, próximo a parede, onde se encosta e pensa e repensa sobre sua vida, enquanto o professor na frente da sala passa horas falando sobre leis, teses e leis, horas essas que seus olhos azuis não vêem passar, como se estivesse estagnado no tempo sem ter um propósito no qual estar ali sentado.
Durante o intervalo sorri, cumprimenta os amigos, as amigas, conversa sobre coisas alheias, sobre a vida, vida essa que seus olhos vão vêem mais graça, mas ele continua ali a olhar as pessoas ao redor, sem perceber os amigos, os flertes, o assunto e ainda assim sorri como se nada estivesse acontecendo. Retoma ao assunto, faz piadas em que todos riem e que pra ele não faz sentido algum. Respira e senta-se sozinho com seu livro de leis inúteis e seu lanche, a sombra de uma bela arvore, onde pode pensar na sua solidão.
O sol, as nuvens, as pessoas que passam por ali são apenas borrões, uma obra abstrata que não faz mais sentido algum, nem mesmo suas leis serve de algum motivo para se viver ou fazer justiça, algo que não existe perante seus olhos, é então que uma bela moça se aproxima a mesma moça de alguns meses atrás quando se conheceram, ela tem a mesma beleza, a mesma simpatia, a mesma graciosidade, mas que seus olhos não conseguem ver mais.  Ela o cumprimenta com um beijo e senta-se entre suas pernas, deitando no seu peito e começa a falar sobre o dia, sobre eles, sobre futuro palavra esta que significa muito, mas não se aplica a quem não sabe o que deseja ser hoje.
No fim do dia ele volta pra casa junto com a bela moça, de alguns meses de relacionamento, ela se acomoda como se aquele lugar já fosse um pouco dela, deita na cama e liga a televisão enquanto ele vai para o banheiro tomar outro banho, sentir a água escorrer e pensar e pensar e pensar, sem ter mais no que pensar. Há apenas o vazio, o vazio do seu corpo que seu olhar nunca alcança a alma.
A porta se abre e a moça entra no banheiro enrolada em uma tolha, ele a olha calmo e despreocupado, enquanto ela tira a o pano macio ao redor do corpo e o deixa pendurado entrando no box para acompanhá-lo em seu banho. Ela o beija sutilmente, como só existisse aquele momento, em que seus lábios se encontram, seus corpos se juntam e que a água escorre por entre ele e suas dobra, seus seios e desejos.
No entrelaçar das bocas e das pernas, o ponto crucial se da na cama onde os dois ainda um pouco úmidos continuam a fazer seus corpos se tocarem e sentir o calor da respiração sendo eles agora apenas um, e ninguém mais, nem mesmo a solidão está ali presente, pelo menos pra ela. Mesmo depois de ser amado por alguém, a vida continua a mesma e ele não percebe quem está ao seu lado, agora dormindo como um anjo, seus olhos azuis não vêem mais a paixão de antes e só consegue ver de forma deturpada que todos os eu te amos foram ditos em vão.
Levanta-se da cama vai tomar uma água, respira. Volta pra cama e não consegue dormir. Levanta-se de novo vai para a sala e tentar ler um livro, mas não consegue, seus olhos azuis estão mergulhados em um mar onde não há ilhas nem continentes para se nadar até lá e procurar pro vida. Volta pra cama olha aquele anjo e continua sem ter sono, sem ter paz, sem ter certeza do que quer. Aos poucos o cansaço toma conta de seu corpo e acaba pegando no sono, para mais uma noite tranqüila, apenas para uma noite tranqüila, nada mais.
Quando a profundeza do azul dos seus olhos se abrem pra ver e tentar viver esse novo dia, vê a bela moça se arrumando para sair e ter mais um dia da sua rotina, e antes que ela saia, uma vontade o toma e seus olhos se enchem de lagrimas e ele com um tom de voz fraco não responde ao bom dia da moça, apenas diz “preciso de um tempo”. Ela olha pra ele sem entender, enquanto os olhos azuis não conseguem encontrar os castanhos dela e dizer face a face. Sem olho no olho, sem coragem.
E ele diz, mais uma vez “preciso de um tempo”. Ela começa a chorar, não insiste, nem pensa duas vezes, pega suas coisas e sai. Ele continua com os olhos fixados no chão inundados de lagrimas de incerteza, inundados de lagrimas de duvidas, inundado de lagrimas do vazio que continua ali dentro dele.  Não sabe se o que fez foi certo da mesma forma que não sabe o que quer da vida ou o que a vida quer dele, da mesma forma que não sabe se quer continuar vivendo daquela forma ou de forma alguma.
Ele se levanta e vai olhar-se no espelho. Quando olha vê apenas um homem, de olhos azuis, um homem, que não sabe o que fazer consigo, um homem a quem acha que não deve ser amado por não saber o que é amar, um homem que um dia disse a si que seria feliz faria o que lhe desse vontade, não importasse o que os outros pensassem, seria apenas ele e a felicidade.
Hoje ele olhou no espelho e continuou vendo ele, ele e a solidão. Esse homem que queria se sentir vivo mesmo que fosse morrer em seguida, ele decide que se for morrer deve ser de felicidade, de amor, não por vazio como está agora. Seu nome não representa muita coisa agora, é apenas mais um João. O João alguém, que hoje é um João ninguém. Ele abre a torneira, e abaixa-se para lavar o rosto. Com o rosto ainda molhado ele abre seus olhos azuis, se olha mais uma vez e decide ser mais que um João, seja o João que for.

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